Gestão, história decolonial e literatura: Macunaíma como personagem antropofágico para (re)pensarmos a crítica nos Estudos Organizacionais

Ítalo da Silva, Pâmela Karolina Dias, Elisabeth Cavalcante dos Santos
DOI: https://doi.org/10.21529/RECADM.2021024

Texto completo:

PDF

Resumo

Diante do contexto assimétrico de poder na produção de conhecimento e na perpetuação institucional da colonialidade na área dos Estudos Organizacionais (EOR), a nossa reflexão neste artigo apresenta duas contribuições gerais a partir da articulação entre os âmbitos da gestão, história e literatura. De início, perguntamos como poderíamos repensar a crítica nos Estudos Organizacionais (EOR) a partir do olhar histórico-decolonial frente à realidade da gestão local que constitui nossas demandas empíricas. Assim, resgatamos a obra literária “Macunaíma, o herói sem nenhum caráter”, escrito por Mário de Andrade, e o conceito de antropofagia, para propormos projetos epistemológicos críticos que compreendam o descompasso epistêmico entre o Norte e o Sul Global. Argumentamos que o constructo de gestão “às avessas e sem caráter” fornece um potencial teórico de interpretação da gestão praticada no Sul Global, a qual compreende elementos de não unicidade identitária, de um “entre lugar” moderno/colonial conflituoso e ambíguo, além de reverberar traços antropofágicos que demarcam a gestão tropical mediante à transculturação, flexibilidade, adaptabilidade e miscibilidade. Ao final, mostramos como nossas experiências anteriores com organizações das culturas populares nos possibilitou apresentar a ambivalência analítica e pluriversal da gestão local através de traços organizacionais derivados da ancestralidade, cotidiano, misticismos e transmissão de saberes pela oralidade.


Palavras-chave

gestão; literatura; história decolonial; antropofagia; epistemologia


Compartilhe


Referências


Abdalla, M. M., & Faria, A. (2017). Em defesa da opção decolonial em administração/gestão. Cadernos EBAPE.BR, 15(4), 914-929.

Alcadipani, R., & Rosa, A. R. (2011). From grobal management to glocal management: Latin American perspectives as a counter‐dominant management epistemology. Canadian Journal of Administrative Sciences/Revue Canadienne des Sciences de l'Administration, 28(4), 453-466.

Alcadipani, R., Khan, F. R., Gantman, E., & Nkomo, S. (2012). Southern voices in management and organization knowledge. Organization, 19, 131-143.

Andrade, M. (2019). Macunaíma: o herói sem nenhum caráter. Chapecó: Ed. UFFS.

Ballestrin, L. (2013). América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, (11), 89-117. https://dx.doi.org/10.1590/S0103-33522013000200004

Booth, C., & Rowlinson, M. (2006). Management and organizational history: prospects. Management & Organizational History, 1(1), 5-30.

Beyes, T., Costas, J., & Ortmann, G. (2019). Novel thought: towards a literary study of organization. Organization Studies, 40(12), 1787-1803.

Clark P., & Rowlinson, M. (2004). The treatment of history in organisation studies: towards an ‘Historic Turn’? Business History, 46(3), 331-352.

Corrigan, L. T., & Mills, A. J. (2012). Men on board: actor-network theory, feminism and gendering the past. Management & Organizational History, 7(3), 251–265. https://doi.org/10.1177/1744935912444357

Couto, F. F., & Carrieri, A. (2018). Enrique Dussel e a filosofia da libertação nos estudos organizacionais. Cadernos EBAPE.BR, 16(4), 631-641.

Couto, F. F., Honorato, B. E. F., & Silva, E. R. (2019). Organizações outras: diálogos entre a teoria da prática e a abordagem decolonial de Dussel. Revista de Administração Contemporânea, 23(2), 249-267.

Durepos, G., Shaffner, E. C., & Taylor, S. (2019). Developing critical organizational history: context, practice and implications. Organization, 28(3), 449-467.

Dussel, E. (2002). World-system and "Trans"-Modernity. Nepantla: Views from South, 2(3), 221-244.

Dussel, E., & Ibarra-Colado, E. (2006). Globalization, organization and the ethics of liberation. Organization, 13(4), 489–508. https://doi.org/10.1177/1350508406065852

Escobar, A. (2007). Worlds and knowledges otherwise: the Latin American modernity/coloniality research program. Cultural Studies, 21(2-3), 179-210.

Faria, A., & Bispo, M. S. (2020). Estórias do passado para um futuro pós-COVID 19: além da normalidade da ‘boa gestão’. Gestão E Sociedade, 14(39), 3759-3768. https://doi.org/10.21171/ges.v14i39.3311.

Freitas, R. O., & Matos, L. M. (2019). Macunaíma em quadrinhos: aspectos estéticos modernistas na rapsódia gráfico-visual antropofágica. Galáxia (São Paulo), (40), 159-176. https://doi.org/10.1590/1982-255437270.

Godfrey, P. C., Hassard, J., O’Connor, E. S., Rowlinson, M., & Ruef, M. (2016). What is organizational history? Toward a creative synthesis of history and organization studies. Academy of Management Review, 41, 590–608, https://doi.org/10.5465/amr.2016.0040

Grafström, M., & Jonsson, A. (2019). Toldos profissionais? O romance como um abrir de olhos na análise organizacional. Culture and Organization, 25(2), 146-158, DOI: 10.1080 / 14759551.2018.1508212

Ibarra-Colado, E. (2006). Organization studies and epistemic coloniality in Latin America: thinking otherness from the margins. Organization, 13(4), 463–488.

Imas, J. M., & Weston, A. (2012). From Harare to Rio de Janeiro: Kukiya-Favela organization of the excluded. Organization, 19(2), 205-227.

Islam, G. (2012). Can the subaltern eat? Anthropophagic culture as a Brazilian lens on post-colonial theory. Organization, 19(2), 159-180.

Kieser, A. (1994). Why organization theory needs historical analyses—and how this should be performed. Organization science, 5(4), 608-620.

Lima, B. D. T. D. C. (2016). Eles devoraram tudo: primitivismo, barbárie e as vanguardas. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, (64), 296-309.

Lindote, M. L. P. M., Goudel, F. R., & Garcez, M. B. (2007). Raízes antropofágicas: labirintos e paradoxos na constituição formativa do modernismo brasileiro. DAPesquisa, 2(4), 229-233.

Maclean, M., Harvey, C., & Clegg, S. R. (2016). conceptualizing historical organization studies. Academy of Management Review, 41(4), 609–632.

Maldonado-Torres, N. (2007). On the coloniality of being: contributions to the development of a concept. Cultural Studies, 21(2-3), 240-270. http://dx.doi.org/10.1080/09502380601162548

Maldonado-Torres, N. (2011). Thinking through the decolonial turn: post-continental interventions in theory, philosophy, and critique - an introduction. Transmodernity: Journal of Peripheral Cultural Production of the Luso-Hispanic World, 1(2), 1-13.

Mignolo, W. D. (2007). Delinking: the rhetoric of modernity, the logic of coloniality and the grammar of de-coloniality. Cultural Studies, 21(2-3), 449-514.

Mignolo, W. D. (2008). Desobediência epistêmica: a opção descolonial e o significado de identidade em política. Cadernos de Letras da UFF – Dossiê: Literatura, língua e identidade, 34, 287-324.

Mignolo, W. D. (2009). Epistemic disobedience, independent thought and decolonial freedom. Theory, Culture & Society, 26(7–8), 159–181.

Mignolo, W. D., & Tlostanova, M. V. (2006). Theorizing from the borders: shifting to geo and body-politics of knowledge. European Journal of Social Theory, 9(2), 205–221.

Mignolo, W. D., & Walsh, C. E. (2018). On decoloniality: concepts, analytics and praxis. Raleigh, NC: Duke University Press.

Mills, A. J., Suddaby, R., Foster, W., & Durepos, G. (2016). Re-visiting the historic turn 10 years later: current debates in management and organizational history. Management & Organizational History, 11(2), 67-76.

Misoczky, M, C., & Camara, G. D. (2015). Enrique Dussel: contribuições para a crítica ética e radical nos Estudos Organizacionais. Cadernos EBAPE.BR, 13(2), 286-314.

Misoczky, M. C. (2011). World visions in dispute in contemporary Latin America: development x harmonic life. Organization, 18(3), 345–363.

Misoczky, M. C., Flores, R. K., & Goulart, S. (2015). An anti-management statement in dialogue with critical Brazilian authors. Revista de Administração de Empresas, 55(2), 130-138.

Misoczky, M. C. (2019). Populism/people/popular: reflections from a Latin American perspective. Organization, 1-9. https://doi.org/10.1177/1350508419870893

Misoczky, M. C., & Camara, G. D. (2020). To think from Latin America in dialogue with the organization of decolonial social struggles: exploring possibilities. Revista de Administração de Empresas, 60(2), 93-103. https://doi.org/10.1590/s0034759020200203

Melo, A. C. (2010). Macunaíma: entre a crítica e o elogio à transculturação. Hispanic Review, 205-227.

Nitschack, H. (2013). Tropische subjektivität und europäische bildungstradition: Macunaíma, der Held ohne jeden charakter von Mário de Andrade. Oder: Macunaíma, ein Wilhelm Meister in den tropen?. Pandaemonium Germanicum, 16(22), 156-178.

Pinheiro, I. A., Vieira, L. J. M., & Motta, P. C. D. (2010). Construindo pontes entre saberes: da literatura à gestão. Organizações & Sociedade, 17(55), 641-664.

Pinto, F. L. B., & Ribeiro, E. M. (2018). História, literatura e estudos organizacionais: novos olhares sobre as obras de Jorge Amado. Farol-Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, 5(12), 198-267.

Quijano, A. (1992). ‘Colonialidad y modernidad/racionalidad’, in Los conquistados 1492 y la población indígena de las Américas. Quito: Tercer Mundo Libri Mundi.

Quijano, A. (2005). Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In E. Lander (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Buenos Aires: Colección Sur.

Rosa, A. R., & Alcadipani, R. (2013) A terceira margem do rio dos estudos críticos sobre administração e organizações no Brasil: (re)pensando a crítica a partir do pós-colonialismo. Revista de Administração Mackenzie, 14(6), 185-215.

Rowlinson, M., & Hassard, J, Decker, S. (2014). Research strategies for organizational history: a dialogue between historical theory and organization theory. The Academy of Management Review, 39(4), 250-374.

Santos, E. C., & Helal, D. H. (2018). O moderno e o tradicional no agreste de Pernambuco. Ciência & Trópico, 42(1), 140-162.

Santos, E. C., Silva, I. H. F. R., Dias, P. K., & Morais, W. M. (no prelo). Saberes e práticas organizativas das culturas populares em Caruaru-PE. Revista Organizações & Sociedade.

Santos, E. C., Silva, Í. H. F., Dias, P. K., & Morais, W. M. (2020). Mapeando dificuldades e intervenções no cotidiano das organizações de cultura popular em Caruaru-PE. Revista Interdisciplinar de Gestão Social, 9(2).

Sanches, M. N. (2019). Apresentação herói primitivo. In M. N. Sanches, & O. Silvana (Orgs.). Macunaíma: o herói sem nenhum caráter. Chapecó: Ed. UFFS.

Thexton, T., Prasad, A., & Mills, J. A. (2019). Introduction: learning empathy through literature. Culture and Organization, 25(2), 83-90.

Wanderley, S. E. D. P. V., & Bauer, A. P. M. (2020). " Tupi, or not Tupi that is the question": Perspectivismo amerindio y estudios organizacionales. Revista de Administração de Empresas, 60(2), 144-155.

Wanderley, S., & Barros, A. (2018). Decoloniality, geopolitics of knowledge and historic turn: towards a Latin American agenda. Management & Organizational History, 14(1), 79-97.

Weatherbee, T. G. (2012) Caution! This historiography makes wide turns: historic turns and breaks in management and organization studies. Management & Organizational History, 7(3), 203-218.

Wood, T., & Caldas, M. P. (1998). Antropofagia organizacional. Revista de Administração de Empresas, 38(4), 6-17.

Zald, M. (1993). Organization studies as a scientific and humanistic enterprise: toward a reconceptualization of the foundations of the field. Organization Science, 4(4), 513-528. Retrieved July 21, 2020, from www.jstor.org/stable/2635078.




Licença Creative Commons
Esta obra está licenciada sob uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.