Mulheres sertanejas cordelistas e a organização de um espaço de fala no cordel feminino

Marina Dantas de Figueiredo, Juliana Cristina Teixeira, Luciana Bandeira de Oliveira Feitoza
DOI: https://doi.org/10.21529/RECADM.2021023

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Resumo

O direito à fala, como direito de se expressar e ter sua narrativa e interpretação da realidade vivida considerada, tem sido historicamente negado ou dificultado a determinados grupos sociais. As mulheres sertanejas, sobre as quais interseccionam categorias de opressão, seguem lutando contra heranças da desigualdade estrutural de gênero,  que colocam o sertão brasileiro em condições estruturais subalternizadas. Nosso objetivo neste estudo é propor a ideia de ‘espaços de fala’ para analisar a busca por legitimação de formas de produção de conhecimento no âmbito das práticas cotidianas de enfrentamento de mulheres sertanejas cordelistas, na forma de expressões subjetivas coletivas ou individualizadas, especificamente no contexto da literatura de cordel. Para tanto, realizamos pesquisa qualitativa baseada em análise documental de cordéis e observação não participante para compreender como a prática literária de mulheres cordelistas se constitui enquanto espaço de fala.  Numa contribuição à teoria sobre lugar de fala, concluímos que a organização da literatura de cordel como ‘espaço de fala’ passa pela (1) apropriação feminina do cordel como meio de reivindicação, que assume a função de representação escrita da fala das mulheres sertanejas; (2) busca por reconhecimento das cordelistas, individualmente, na cena literária do cordel; e (3) relação com o ativismo político em torno das questões femininas e do vocabulário feminista.


Palavras-chave

espaço de fala; gênero; etnia; identidade; mulheres sertanejas; literatura de cordel


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